Bolo de caixinha

Desde o início do confinamento mantenho a responsabilidade de pilotar a longa lista de compras do supermercado que, como sempre,contém

Desde o início do confinamento mantenho a responsabilidade de pilotar a longa lista de compras do supermercado que, como sempre,contém algumas extravagâncias. Se isso já era rotina, imaginem agora que estamos permanentemente dentro de casa, comendo quando está claro e dormindo quando escurece.

Sábado pela primeira vez vi, ao vivo, as moças do caixa usando uma espécie de capacete transparente para a proteção do rosto. Uma imagem futurista, assustadora, digna de filmes de ficção cientifica ou do filme  Perdidos no Espaço, nos áureos anos 70 da televisão.

Na entrada do super o controle era rígido, gerando atritos com gente apressada que queria chegar e entrar direto. Com paciência, um funcionário informava que havia determinações para limitar o acesso. Para entrar era preciso esperar a saída de alguns clientes.

Dentro da loja havia congestionamento em coredores. Além da busca mais intensa por determinados produtos, os chamados “túneis de Páscoa”, formados por bombons, ovos gigantes e chocolates prejudicavam a circulação pela redução de espaço.

Ao longo do tempo em que permaneci no supermercado fiz uma pesquisa visual, bisbilhotando carrinhos alheios. Cerveja, carvão, chocolates, pizzas, ovos, farinha de trigo, sucos e refrigerantes lideravam a preferência popular. Além, é claro, de materiais de limpeza.

Pouco antes de sair tive a atenção chamada por um casal cujo carrinho transbordava de bebidas – refri, cerveja, vinho e uísque – e gêneros alimentícios. O tom de voz se destacou na multidão diante da gôndola de produtos pré-fabricados.

– Por que tantos bolos de caixinha? – perguntou indingado o marido.

Ela, sem desviar o olhar da prateleira e com evidente objetivo de ser ouvida pela vizinhança, disparou:

– É pra quando tu acordar depois do almoço, te atirar no sofá pra ver aqueles jogos antigos e berrar: “Mulher, não tem nada pra beliscar com um café preto ou um chimas?”.

Observando o cotidiano sigo para a terceira semana de confinamento, quebrado apenas para as compras e dois passeios com o cachorro de casa – um no início da manhã e outro tarde da noite. Este último está suspenso porque, com a cidade deserta, muitos assaltos têm ocorrido em todos os bairros de Porto Alegre. Todo cuidado é pouco!