A imigração italiana nos fragmentos da família Tumelero e nas manifestações culturais do Grupo Náni

Dos portos de Santos aos campos da Linha Jacinto: a jornada de Anotinho Tumelero e sua família, uma das últimas a chegar no Brasil em 25 de dezembro de 1921

Reportagem especial: José Ademir Theodoro

O Aqui é Meu Lar, da Rádio Miriam, apresentou em outubro matéria com Antoninho Tumelero, na comunidade de Santa Cruz, na Linha Jacinto. Sua família foi uma das últimas a chegar no Brasil, com seus descendentes desembarcando em Santos (litoral de São Paulo), no dia 25 de dezembro de 1921. Era Domênico Tumelero, que aportou com os filhos, Antônio Tumelero, Casemiro, Vitório, João, Détio e a filha Maria Tumelero. De Santos, rumaram para o Sul.

Eles saíram de Vicenza, na Itália, após terem lutado na guerra, fugidos. Vieram para Pinto Bandeira, onde Antoninho desconfiava que já existia Tumelero naquele local, e que possivelmente seriam primos de seus antepassados. Eles permaneceram por um período com os primos em Pinto Bandeira e, posteriormente, migraram para a Capela Santa Cruz. Antoninho lembra que seu avô contava que antes de chegar ao Sul, teria morado por dois anos em outro estado e trabalhado por lá. Domênico chegou em Pinto Bandeira viúvo e com os sete filhos.

Depois de um tempo morando em Pinto Bandeira, eles compraram uma área em Santa Cruz e foram morar lá. Com o tempo compraram mais terras e adquiriram uma área em Linha Jacinto. Seu avô, Antônio Tumelero, era casado com Beatriz Poli Tumelero, ambos chegaram casados da Itália. Seu pai nasceu na comunidade de Santo Antônio, que hoje pertence à Farroupilha, e casou-se com Irma Anunciada Girelli, que morava na Linha Jacinto. O pai do seu avô por parte de mãe veio de Crema, na Itália. Já seu avô nasceu em Nova Roma e casou-se com Regina Favorecini, com quem teve 12 filhos.

  • Antoninho conta que quando moravam com o pai, plantavam milho, trigo e abóbora, e criavam alguns animais para o sustento.
  • A parreira era pouca, colhiam cerca de oito a 10 mil quilos por safra, grande parte era utilizada para o vinho de consumo próprio.

Antoninho nasceu em Santo Antônio e tem mais três irmãos e uma irmã. Ele se criou com os pais e seus avós. Assim que familiares iam casando, saiam da casa paterna. Ele lembra que quando tinha seis anos de idade, seu pai se mudou para a Capela Santa Cruz, na mesma propriedade onde reside até hoje. Quando se mudaram, foram morar em uma casinha velha de madeira onde, com os irmãos e o pai Tercilio João Tumelero, passaram muitas dificuldades. O pai de Antoninho ganhou 12 hectares de terra de seu avô e comprou mais 12, da nona, que havia ficado viúva e passou a morar em Bento Gonçalves.

O pagamento era sempre em novembro, época da colheita do trigo, pois era dali que saia o dinheiro para pagar a parcela da terra. Seu pai vendia pouco mais da metade do trigo e o restante deixava no moinho para ir consumindo durante o ano. Sua avó morava em Bento com uma filha e todo o mês de novembro ia na sua casa buscar o dinheiro. As vezes completava o pagamento com a venda de abóboras. Antoninho conta que ficou na colônia até aos 28 anos e, depois, com os irmãos, se aventurou com uma loja de tintas em Farroupilha, mas acabou não dando certo. Com a certeza de que a agricultura rendia mais, decidiu voltar. Hoje, todos seus irmãos moram na colônia.

Antoninho e Augustinho moram na mesma terra, e outros dois irmãos, que são solteiros, ocupam a casa paterna. Hoje Antoninho trabalha com uva em parceria com os irmãos, que ainda possuem um pequeno comércio de venda de tratores. São 10 hectares de uva totalmente mecanizados, cultivados junto com os irmãos e seu filho. Ele conta que, como seu pai não tinha condições financeiras para dar estudos aos filhos, seu sonho era construir uma casa nova para a família e ter um carro para sair. Isso, aos 12 anos de idade, mas os irmãos nunca se separaram, pelo contrário, sempre estiveram unidos.

Na época em que era jovem, a família começou plantar parreiras e, aos poucos, o retorno financeiro foi aumentando. “Mas antes das máquinas, quando tinha café, faltava o açúcar, tinha o açúcar e o café, faltava o pão. Polenta e queijo nunca faltou. Roupas, apesar de ganhar dos vizinhos, se passou muito frio”, conta. Ele lembra que a família Rigon doou xícaras para eles poderem tomar café. Já aos 15 anos de idade trabalhava pela região para possuir algum dinheiro, que era usado para comprar roupas e ir aos bailes nos finais de semana.

“Nos bailes se esperava até às quatro da manhã para entrar, quando o pessoal parava de cobrar a entrada”, lembra. Antoninho era um jovem que pensava primeiro em construir uma casa nova com o pai, depois começou frequentar festas até os 27 anos. Nesta idade, conheceu Rosa Fátima Busetti Tumelero, que é da região da Capela São Luiz. Namoraram por 11 anos, somando mais 27 anos de casados. O casal está junto há 38 anos. Em 2.000 nasceu William Antônio Tumelero. Em 2007, veio Suelen Cristina Tumelero. Agora com 18 anos de idade, Suelem cursa Arquitetura na UCS, em Caxias do Sul, e William trabalha na agricultura com o pai. Ele acredita que o filho vai sucedê-lo na colônia. Por isso, para incentivá-lo, Antoninho paga mensalmente um valor para o filho fazer seu próprio caixa.

Cultura italiana

Sobre preservar e difundir a cultura italiana, Antoninho conta que teve incentivo de alguém, ou seja, copiou do grupo Nei Tempo Del Filó. “Me lembro que ia nas festas em Nova Milano. No Entrai, via eles cantando, fazendo festa, pensei: ‘tenho que entrar nesse grupo também’. Só que depois as coisas mudaram e eu comecei, devagarinho, com o jogo da mora nas comunidades, com outros colegas, que hoje fazem parte da cultura também, foi assim que surgiu o grupo”, recorda. O grupo foi fundado em 2007 mas, neste período, por não ser conhecido, ficou quase três anos com poucas atividades. Agora, praticamente todos os finais de semana estão preenchidos.

O Náni é fruto da união de amigos que jogavam mora e mais um grupo de mulheres de São José, que um dia participou de um desfile do Entrai, no centro de Farroupilha. Antoninho conta que Náni era seu apelido na escola e o nome do grupo não estava definido, mas aí em uma festa em Nova Roma, na La Vendemmia, ele foi com outros integrantes jogar mora. Na mesa em que estavam chegou o prefeito de Nova Roma e quis tirar fotos juntos, depois queria agradecer o grupo e perguntou o nome, aí todos ficaram em “ponto morto”. Ninguém sabia o nome do grupo, aí disseram Grupo Nani e ficou esse nome. Hoje a agenda é cheia, mas Antoninho conta que não esperava tanto sucesso, não tinha essa expectativa. Ele acredita que o trabalho começou ficar mais conhecido e ganhou forma a partir de 2010 com a Festa do Vinho Novo, em Forqueta.

  • Quando a Sandra Bonetto, hoje vereadora, contratou o grupo e disse: “Tumelero, o que é de vocês ninguém tira, vão com calma que vai aparecer bastante serviço para vocês”. Eu disse: “‘”acho que a Sandra tem razão, e realmente o conselho que ela me deu, deu certo”, comemora.

Hoje Antoninho acredita que faz um trabalho que representa bem a cultura italiana, e por isso que hoje é difícil ter um fim de semana sem apresentação. Conta ainda que a formação do grupo vem muito da vontade de cada um que vê o grupo se apresentar e procura para fazer parte. Mas lembra que tem um limite no grupo, por isso todos os integrantes são consultados para saber quando tem vaga. Ele lamenta que nos últimos tempos o grupo tenha reduzido por problemas de saúde de alguns integrantes e por morte de outros. Alguns deixaram o grupo pelas limitações físicas, já que tem muitas atrações à noite.

Mas isso não é problema, não estamos com ansiedade de aumentar o grupo, hoje ele está sadio”, disse. O Náni tem muitas participações em Caxias, Bento Gonçalves e Farroupilha.

Antoninho se considera uma pessoa alegre, mas quando é trabalho, leva a sério e sabe dividir as coisas. “Não posso falar bobagens, porque eu gosto de falar bobagens, mas quando é uma apresentação eu já mudo, porque já saio de casa para alegrar ou transmitir alegria, então por isso que eu já mudo o jeito de ser”, explica. Ele acredita que as pessoas gostam do jeito que faz, pois tem tido esse retorno, que é muito grato para o grupo.

Em 2024 o Náni realizou cerca de 50 apresentações e este ano deve passar de 80. Assim, Antoninho se sente realizado, pois desde pequeno sempre gostou de músicas e pessoas no palco. “Então um dia eu imaginava subir no palco para alegrar alguém e isso estou fazendo, eu tiro o tempo, sempre procuro tempo, é um divertimento meu também, me sinto bem”, garante. Antoninho diz que gostaria de finalizar os dias onde mora hoje, porque gosta muito de sua propriedade.

“Já tentei a vida na cidade, vi que realmente na agricultura é meu lugar. Quero criar minha família aqui e dar um rumo para o filho e a filha. Como trabalhamos em quatro irmãos juntos, um tem o compromisso de ajudar o outro nas doenças, tristezas e alegrias, assim estamos vivendo mais tranquilos e seguros. Tropeços na vida a gente sempre dá, vai que um precisa do outro, estamos aí, um perto do outro, a 50 metros, então é só um grito e a gente se ajuda, graças a Deus. A família aceita as decisões dos quatro irmãos e está tudo certo assim”, conclui.