Fora de casa na noite de 24 de dezembro

Noite de 24 de dezembro. Família, pratos típicos, presentes, orações, festa. Todos reunidos? Não. Algumas pessoas, pelas profissões que escolheram, passam ? ou já passaram – a data trabalhando. Conversamos com algumas delas para saber qual o sentimento que experimentaram pela ausência na família
em uma celebração tão especial. Nem por isso a noite deixa ? ou deixou – de ser feliz

Natal.

Pessoas como a maioria de nós celebram a data com os parentes, em volta de uma mesa farta, compartilhando momentos e alegrias. Mas na noite de 24 de dezembro, quando acontece a ceia de Natal, há pessoas que, por
causa de suas profissões, não estão em seus lares, cercadas pelo brilho e pelos aromas típicos.

Quem já experimentou estar distante das comemorações não esquece mais, mesmo tendo consciência de que
passar datas especiais no exercício da função é parte da escolha que fizeram para si.

Daiane Silva
34 anos, enfermeira há seis anos e meio

Há pouco mais de quatro meses estou atuando como enfermeira do Pronto Socorro no Hospital São Carlos e Responsável Técnica do SAMU de Farroupilha. Venho de Jaguarão.

Em 2012 foi a primeira vez que passei o Natal trabalhando. Foi e sempre será compensador do ponto de vista profissional e humano, apesar da circunstância, porque foi o que optei por fazer para o resto da minha vida e eu encaro isso de forma muito profissional. 

As noites de fim de ano durante nossa jornada de trabalho não são diferentes das demais. Geralmente, algumas equipes se organizam para realizar confraternizações simples e rápidas, onde os funcionários vão se revezando nos seus intervalos durante a jornada de trabalho.

O que mais me toca por estar longe nestas datas é a falta do aconchego da minha família. O que me fortalece é que esse sentimento de falta vem sendo moldado mesmo antes de existir, desde o início, quando optei por seguir essa profissão, pois eu sabia que iria renunciar muitas festas em família em função do que me propus a fazer. 

Tem uma frase que gosto muito e sempre carrego comigo, ela diz: O que somos hoje é resultado de decisões que tomamos no passado e o que seremos amanhã, será consequência do hoje. Então, estamos preparados para tal papel e com certeza desempenharemos o nosso melhor, pois o nosso fazer não pode parar nunca, é um seguimento, um ciclo contínuo. 

Leandro Morais
33 anos, há nove anos na Brigada Militar

Temos consciência, pela nossa escolha de vestir a farda, que é necessário o trabalho contínuo da polícia. Nas festas, dividimos o efetivo: metade folga no Natal e a outra metade, no Ano Novo.

É até estranho quando passo o Natal com a família porque há nove anos tenho esta rotina. A gente não lamenta tanto porque há a pausa do jantar, na noite de 24 de dezembro, e fazemos uma ceia com o pessoal da Brigada. Não é um isolamento. 

O que passa pela cabeça é que eu posso estar me privando, mas também posso ajudar quem precisa nesta data. Faz parte da profissão. Não podemos deixar a comunidade vulnerável. A Brigada trabalha na repressão e também na prevenção de ocorrências.

Natiele de Mattos Rodrigues
29 anos, há seis anos na Brigada Militar

Eu prefiro folgar no Natal, então como temos a opção de escolher, eu e meu marido, que também é da Brigada, preferimos passar com a família, mas Ano Novo estamos sempre nas ruas.

Nessa época de festas, as pessoas viajam mais, então precisamos redobrar a atenção, circular mais e estarmos alertas porque é um período que sempre acontece algo. Um minuto está tudo tranquilo, no seguinte a ação está acontecendo.

Thiago Brunet
37 anos, médico ginecologista e obstetra há 12 anos

Em quase 12 anos de Medicina já fiz uns cinco ou seis plantões no Natal. Neste ano vou passar com meus pais. O que tenho para dizer é que nos meus plantões, sempre dentro de hospitais, o espírito natalino era sempre muito forte entre todos. Fazíamos uma confraternização entre todos os setores, algumas pessoas levavam as famílias, eu mesmo levei meu filho Caetano, ainda no berço, para uma ceia e
m um plantão. Oramos, conversamos e fizemos tudo aquilo que Cristo preconiza. Sempre era muito bacana.
Já fiz parto na noite de Natal e lembro de uma ocasião especial, em que eu era residente na cidade de Pelotas, que me vesti de Papai Noel para atender as gestantes e acabei fazendo um parto meio com a vestimenta. Quando o bebê nasceu, o levei, ainda com a roupa de papai Noel, como presente ao pai. Foi um momento bem alegre da minha vida e tenho certeza que na vida daquela família também. Este foi um registro de plantão de Natal bem bacana nestes 12 anos de Medicina.

Um hospital tem que estar sempre funcionando e os profissionais de saúde precisam estar ali para atender. 
Deixo meu recado de bom Natal a toda equipe que estará de plantão na noite de 24 de dezembro em Farroupilha. Natal é um período de reflexão, um período que a gente tem que ser bondoso e generoso, que são as duas maiores características de Jesus Cristo, uma pessoa simples, correta nas atitudes e que conseguiu ter o apoio de muita gente. É isso que a gente preconiza, que a gente quer seguir como ideal de vida.

Leonardo Pereira
42 anos, vigilante há 16 anos.

Como eu não tenho filhos, troco o Natal com os colegas que têm filhos, para que eles passem ao lado da família e aí eu folgo no dia 31 de dezembro. Já passei várias datas longe da Karen, minha esposa. Eu a levo para Guaíba no dia 23 para que ela fique com a família dela e a busco no dia 26. 

Minha celebração é somente comigo e com Deus e quando há colegas de trabalho naquela noite, sinto que nós vivenciamos mais o verdadeiro sentido do Natal, que é a comemoração do nascimento de Cristo. Hoje há apenas uma festa gastronômica, na qual as pessoas consomem muita bebida alcoólica.

Em noites como a de 24 de dezembro, nosso cuidado é redobrado nas rondas. Enquanto uns descansam, outros trabalham, mas na minha opinião melhor profissão que a minha não há porque o vigilante é a pessoa que está acordada quando todos estão dormindo, que está em pé quando todos estão sentados. Enquanto nós cuidamos das outras pessoas e de seus patrimônios, nossa casa e nossa família estão desprotegidas. Isso é nobre, então não me importo em passar o Natal trabalhando.

Ewerton Silveira de Bitencourt
38 anos, pai de Gabriela, 8 anos e Lucas, 5 meses. Bombeiro há 12 anos

Quando não estamos trabalhando no Natal, estamos no Ano Novo. Lembro que em uma virada fomos chamados porque o marido queria matar a mulher e ligou o gás de casa. Isso às 23h45! Quando voltamos o ano já tinha virado. 
O Natal para nós é bastante significativo porque somos cristãos, então prezamos muito a data. Já nos reunimos e compramos brinquedos que foram levados à Casa Lar e neste ano recebemos muitas cartinhas, que atendemos na medida do possível. 

Acredito que viram o papai Noel no carro dos bombeiros e imaginaram que ele mora aqui! Somos em 18 bombeiros no total e muitos já levaram umas cartinhas para atender aos pedidos. As crianças pedem de tudo: de bombom até que o pai volte para casa.

Trabalhamos motivados porque vivenciamos o nosso lema, que é salvar e proteger.

 

Everaldo Vaz de Oliveira
42 anos, bombeiro há 15 anos

As noites de 24 de dezembro são calmas, não lembro de nenhuma ocorrência significativa nestas datas e há bastante tempo somos escalados para trabalhar nestes períodos. O sentimento é que temos que nos doar para que as pessoas se sintam seguras. Tem que ter gente trabalhando.

Nossas famílias vêm para o Corpo de Bombeiros e fazemos a ceia de Natal com elas. Tiramos as viaturas para fora, ligamos as sirenes como forma de comemorarmos a data.

As viradas de ano, as madrugadas, são mais complicadas porque as pessoas se excedem no álcool e aí atendemos ocorrências. (Lembrando que os Bombeiros atendem acidentes automobilísticos com vítimas presas às ferragens). Mas o Natal também tem o lado bom: no ano passado vestimos um colega de Papai Noel e saímos distribuindo balas pela cidade.

É gratificante saber que estamos zelando pelo pessoal que está comemorando. Nós sabemos da nossa missão.