Mais de 206 mil propriedades rurais foram afetadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul

Relatório apresenta os impactos dos eventos meteorológicos sobre a produção rural

As chuvas extremas desde o final de abril causaram danos por inundações e deslizamentos em boa parte do território gaúcho. No meio rural, mais de 206 mil propriedades foram afetadas, com perdas na produção e na infraestrutura, e 34.519 famílias ficaram sem acesso à água potável. Esses dados constam no relatório de perdas referente à maior calamidade climática que atingiu o Rio Grande do Sul, divulgado segunda-feira, 3 de junho, pelas secretarias da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) e de Desenvolvimento Rural (SDR).

O documento, que abrange o período entre 30 de abril e 24 de maio, foi elaborado pela Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/RS-Ascar). Os dados são oriundos do sistema Sisperdas – abastecido com informações de todos os escritórios regionais e municipais da Emater. Durante as chuvas intensas, 9.158 localidades foram atingidas. Atualmente, dos 497 municípios gaúchos, 78 estão em estado de calamidade pública (a maior parte no Vale do Taquari e na Região Metropolitana de Porto Alegre), enquanto 340 estão em situação de emergência.

“É a maior tragédia da história do nosso estado, e atinge proporcionalmente a agricultura, que é nosso maior setor produtivo. A partir desse levantamento de perdas vamos agir com mais precisão e celeridade na estruturação de ações e políticas públicas para auxílio aos agricultores familiares e recomposição de áreas produtivas”, afirmou o titular da SDR, Ronaldo Santini. Em relação a produção de grãos, as perdas são em áreas que não puderam ser colhidas, ou que foram colhidas e tiveram baixo rendimento, incluindo soja, milho e feijão, entre outros.

As perdas nas culturas de inverno foram pontuais e correspondem às áreas recém-semeadas, que deverão ser replantadas. Foram prejudicados 48.674 produtores de grãos, grande parte de milho e soja. “Os números retratam a magnitude que o evento meteorológico causou no agro gaúcho. Ações emergenciais já foram tomadas para tentar minimizar os efeitos nas áreas rurais, como flexibilização de normativas, mas os demais projetos devem ser construídos junto com os setores e entidades, para ajudar na reconstrução dessa área produtiva que é importante não só para a economia gaúcha mas também brasileira”, frisou o titular da Seapi, Giovani Feltes.

No meio rural, 19.190 famílias tiveram perdas relativas às estruturas das propriedades, como casas, galpões, armazéns, silos, estufas e aviários. Em relação à agroindústria, dados preliminares apontam prejuízos para cerca de 200 empreendimentos familiares. A sobrevivência e a acolhida das famílias atingidas foram priorizadas pelos extensionistas da Emater/RS-Ascar em todas as regiões do estado. Além disso, a instituição tem trabalhado no levantamento das perdas sociais, agropecuárias e de infraestrutura que podem ser consideradas na construção de políticas públicas.

Produção primária 

Considerando o volume, a maior perda ocorreu na produção da soja. Foram 2,71 milhões de toneladas perdidas. A estimativa divulgada em março deste ano pela Emater/RS-Ascar era que fossem colhidas 22,24 milhões de toneladas, em uma área plantada de 6,68 milhões de hectares, com produtividade de 3.329 quilos por hectare. Descontando a área afetada pelas chuvas e as perdas, a nova estimativa de produção é de 19.532.479 toneladas, com produtividade média de 2.923 quilos por hectare. O levantamento também traz informações sobre a horticultura e a fruticultura, em especial nas regiões do Vale do Taquari e da Serra, além de regiões próximas à Região Metropolitana, onde se encontra um grande mercado consumidor. 

A produção pecuária gaúcha também foi severamente impactada, exigindo longo período para recuperação. As perdas de animais afetaram de forma significativa 3.711 criadores gaúchos. O maior número de animais mortos nos aviários, com 1.198.489 aves adultas. Também houve perdas de bovinos de corte e leite, suínos, peixes e abelhas. Além disso, uma grande extensão de pastagens foi prejudicada, tanto em campo nativo quanto em áreas de cultivo das forrageiras de inverno. O impacto será direto na produção de leite e de carne nos próximos meses. Nem todas as regiões foram afetadas uniformemente. Em algumas, os danos na pecuária foram muito expressivos, como nos vales dos rios Taquari, Caí, Pardo e Paranhana. 

Frutícolas 

O período do evento climático extremo coincidiu com a fase final de frutificação de importantes variedades de citros, em especial a bergamota, que já estava em colheita. Em muitos pomares, o solo ficou alagado, não somente em razão da inundação, mas por vários dias com precipitações volumosas. Os citros, na região dos Vales, e a banana, nas encostas da Serra do Mar, foram as culturas mais prejudicadas, com impacto para 8.381 propriedades. 

Olericultura 

O abastecimento de hortaliças nos centros urbanos foi fortemente afetado. As culturas de folhosas e leguminosas sofreram maior impacto na Região Metropolitana, na Serra e nos vales do Taquari e do Caí. Considerando o volume e a área plantada, as maiores perdas foram de batata, brócolis e aipim. As dificuldades logísticas para escoar a produção remanescente e a incerteza sobre a demanda provocaram a redução da oferta, mas não houve interrupção total. A intensidade das chuvas danificou a estrutura foliar das olerícolas folhosas (alfaces, rúculas e radiches) e temperos (salsa e cebolinha). Houve prejuízos na qualidade e à aparência das verduras.

O período das chuvas coincidiu com o momento tradicional de mudança das áreas de cultivos olerícolas, em especial na região de Maquiné e no Vale do Paranhana. Nos meses de verão, os cultivos são transferidos para áreas de maior altitude, como nos Campos de Cima da Serra (São Francisco de Paula e Cambará do Sul). O relatório técnico completo inclui, ainda, os impactos para os povos tradicionais, a cultura do arroz, a floricultura, abastecimento, cooperativismo, as produções leiteira e florestal, além de dados meteorológicos e ações para o enfrentamento da calamidade.