De repente, 17

Aqui estou, rodeado de filhos. São três: Júlia (18), Murilo (17) e Mariana (05). Em sendo pedra, eles pousam em

Aqui estou, rodeado de filhos. São três: Júlia (18), Murilo (17) e Mariana (05).

Em sendo pedra, eles pousam em mim como os quero-queros do campo. O Sol delineia a sombra de cada um deles a partir da primeira hora do dia. Eles me usam para ser e esticam ao longe os meus cabelos brancos.

Desde quando nasceram, tive a certeza de que me praticam para pai. Eu os ajudo a crescer: para frente, para cima, para trás, para os lados, … Aqui estamos (eu e a Claudia), a moldar três existências. Cultivamos uma horta repleta de vozes.

Sempre pensei que, aos 17 anos, nenhum filho pediria:

– Pai, escreve uma crônica para mim!

Achei que isto seria impossível, mas não, o Murilo me pediu uma crônica. O meu ofício é escrever. Abro a minha mala de palavras e vou catando letras. O Murilo nasceu em 11 de junho de 2003. Nascer, por si só, é um milagre. Nascer no meu quintal é mais milagre ainda. Um quintal repicado de muros de pedra, pequenos muros tomando banho no orvalho.

A crônica é o meu presente enluarado de aniversário. Vem direto do coração. Respeita o distanciamento. Não faz filas. Usa, se preferirem, máscara. É um pedaço de mim estampado na folha para ler. Cabe na memória e num abraço.

É uma crônica tão importante. Não hesitaria um segundo em estar aqui para que ela seguisse o seu tempo. Na verdade, são três crônicas tão, mas tão, relevantes. Por elas viraria pedra, deitaria por comprido no meio da sala, pintaria, buscaria uma panela de ouro no fim do arco-íris e caminharia um deserto e uma floresta à procura de amoras e de outras frutas do mato.

Estas miudezas são o melhor do churrasco de aniversário. São inúteis, mas garantem a soberania do essencial. As brasas, a costela e a picanha exercem função secundária.

Estas recordações me fazem escutar de novo o primeiro choro. Trazem de volta a primeira visão de um bebê vindo ao mundo. Os primeiros passos têm dezessete anos.

De repente, 17. As primeiras palavras continuam soando como um privilégio carregado de orgulho. Ouço, pela casa, o eco da minha crônica.